Já era o sexto, ou o sétimo, sei lá qual era o dia de caminhada. Não importa. Havíamos chegado em Rubiães, uma megalópole portuguesa de, no máximo, 1500 habitantes... Uma vila típica da região dos vinhos verdes, cheia de paisagens cinematográficas, onde o caminho de Santiago cruzava, e até por vezes entrava, nos parreirais. O relevo dava o tom da marcha: nas subidas, um pouco mais lenta; nas descidas, era um “sai da frente”, mas sem preocupação de chegar... Enfim, estávamos numa típica vila de interior, cercada de parreirais, com muita gente simples e acolhedora.
Nos instalamos no albergue oficial, cuja recepção tinha uma mesinha, um livro, mas nenhuma pessoa. Cada um fazia seu “chek-in” e deixava sua colaboração: em Portugal o habitual era deixar 3 euros por pessoa. O carimbo também era por conta, bastando pegá-lo e usá-lo. Ou seja, um sistema de auto-gestão, que ocorre em outros albergues do caminho em Portugal. Na Espanha, a coisa muda...
O albergue, onde antes era uma escola primária, é bem confortável (para os padrões do peregrino, leia-se), possuindo um amplo dormitório com vários beliches, banheiros separados (em alguns o banheiro de homens e mulheres é o mesmo), duchas excelentes (aliás, em todos eles a ducha era MUITO boa), sala de jantar/estar e cozinha minimamente equipada. Mas suficiente para fazermos um espaguete à carbonara, nosso jantar daquele dia, prato chefiado pela Cláudia e apoiado por nós 4 (Eu, Ian, Sandra e Andrew). Já na sala de jantar, com a mesa decorada pela Sandra, inclusive com flores da época recém colhidas, conhecemos um padre espanhol que estava realizando, pela enésima vez, o trajeto. Foi interessante vê-lo discorrer a respeito do Brasil, e de sua situação econômica. Estamos virando vitrine! Que bom (ou não...)! Muito simpático, na manhã seguinte veio para se despedir de nós. Infelizmente, não o encontramos mais...
Albergue de Rubiães - foto da partida, na manhã seguinte...
Porém, o melhor do albergue estava reservado para a noite... Já havíamos notado que existem muitos coreanos fazendo o caminho. O motivo parece ser a fama do trajeto por aquelas bandas... Não sei exatamente porque. De qualquer forma, nesta noite peguei uma cama próxima da de um coreano. Antes não tivesse feito isso... Deitamos após o jantar, mais ou menos às 22h, e tentamos dormir. Meia hora depois, e nada... Mas, consegui relaxar e iniciei aquele estágio de semi-sonolência, onde o sonho se mistura com a realidade. Lembro-me até agora do sonho: estava num lugar que não conhecia, cercado de gente, todos em pé, e eu no meio da roda de pessoas. Do outro lado, uma pessoa toda vestida de preto, só com os olhos à mostra, empunhando uma espada! Comecei a entender a situação: estava numa arena onde, do outro lado, estava um ninja! Ou algo parecido... De repente, este personagem começou a girar sua espada, fazendo malabarismos, e gritando, o mais alto que podia, e começou vir em minha direção! Caramba! O que faço agora?! Onde é a saída? Comecei a correr, dando voltas na arena, e aquele maluco atrás, não parando de berrar, e eu correndo. Até que vi uma porta. Seria a saída? Não sei... O importante é que era uma porta, e foi para lá que corri, com todas as minhas forças e, quando estava quase chegando, escorreguei e bati forte nela! Acordei! Foi aí que percebi, então, que ao meu lado, no quarto, o coreano roncava tão alto quanto uma moto-serra e, nos “intervalos”, ele berrava coisas na língua dele (ou qualquer outra ininteligível...). Perguntem se consegui dormir depois... O cara não parou de roncar durante toda noite! Depois, por volta das 4h da manhã, ele levantou, arrumou suas coisas e se foi. E nós, que não dormimos a noite toda, tínhamos algumas horas para tentar descansar um pouco... Se o visse numa próxima paragem, não ficaria perto. Mas, não encontramos ele até o final. Ainda bem!
Dormimos como uns anjinhos na noite seguinte! Só acordei com meu próprio ronco, e o resto do quarto dando risadas... Será que eles entendem português?
Beijos
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